sexta-feira, 1 de março de 2013

Caso clínico #1

O caso que trazemos hoje tem relevância para o blog por 2 motivos: 1º por se tratar de uma apresentação clínica rica e de interesse que abre o leque para raciocínio abrangente e 2º por ter sua etiologia esclarecida e documentada em exames complementares bem indicados mantendo correlação com suspeitas clinicas. Casos assim ensinam para a vida e para a prova.

JPF, sexo feminino, 17 anos, internada em unidade hospitalar com história de surgimento de nodulações endurecidas em região cervical há 04 meses associada a dor e hiperemia local. A paciente relata odinofagia, tosse com expectoração amarelada, perda ponderal não mensurada, episódio único de hemoptise e febre vespertina diária. Relato de asma como antecedente médico e dor pleurítica com piora ao decúbito dorsal ao interrogatório sistemático. Ao exame apresenta-se em bom estado geral, com mucosas descoradas (2+/4+), FC 120 bpm, FR 18 irpm, PA 130x80 mmHg. Evidenciada tumoração em região supraclavicular direita dolorosa à palpação, hiperemiada, com calor e flutuação, medindo 06 cm no maior diâmetro, além de adenomegalia em cadeia cervical anterior direita, supraclavicular esquerda, axilar direita e esquerda, de característica indolor, endurecida e móvel.
Em internamento, paciente evoluiu com drenagem espontânea de tumoração cervical sendo constatada saída de secreção purulenta e alimentos através do orifício na pele. Foi passada SNE via EDA que evidenciou fístula esôfago-cutânea, porém, não sendo possível afastar possível fístula esôfago-traqueal. Para melhor elucidação foram realizados exames laboratoriais, biópsia de linfonodo, culturas de secreções, Raio-X de tórax e TC de crânio, região cervical, tórax e abdome com fistulograma. Seguem resultados e imagens abaixo:

#Laboratório: Hb 6,7 Ht 21,1 Leuco 8.000 (S68,5/B0/L17,2/M11,6) Plq 553.000 Na 142 K 3,5 Cr 0,4 Ur 19,9 Glic 79 AST 46 ALT 29 PT 5,4 (A2,3/G3,1) VHS 120 LDH 1254 PCR 14 anti-HIV: Não-reagente


Raio-X de tórax evidenciando derrame pleural e imagem mediastinal


Tomografia computadorizada de tórax mostra trajeto da fístula e imagem em mediastino anterior

Diagnóstico e Discussão:
Trata-se de uma paciente jovem sem co-morbidades importantes como imunossupressão ou doenças degenerativas, com quadro inicial de linfadenomegalia cervical.
Inicialmente, também por se tratar de um caso no Brasil, não podemos tirar da nossa cabeça pensante uma grande suspeita: Tuberculose ganglionar. Da mesma maneira, não excluímos outras causas infecciosas de quadro semelhante como micoses: Actinomicose, Histoplasmose, Paracoccidioidomicose... (investigar clinicamente/procurar nas alternativas da questão/citar como diag dif em prova aberta).
Porém, na investigação do quadro nos deparamos desde o início com uma tomografia e radiografia de tórax que evidenciam claramente uma imagem mediastinal, e aí está um achado que não se pode descartar.

Estamos acostumados a conduzir o diagnóstico diferencial em provas e enfermarias para imagens mediastinais a partir de 4 suspeitas principais que não podem ser esquecidas pela sua importância e facilidade em memorizar: “Os 4 T’s” são eles: 1) Timoma 2) Teratoma 3) Tireoide (patologias tireoideanas que invadem mediastino) 4) Terrível-Linfoma (Linfoma não começa com T e foi bem adaptado). Está claro que este caso poderia ser definido com o resultado da biópsia de linfonodo cervical, a qual confirmou Linfoma B de grandes células mediastinal (não-Hodgkin).

O Linfoma B mediastinal primário é o mais comum dos Linfomas de células grandes localizados no mediastino, sua epidemiologia aponta para uma ligeira prevalência de diagnóstico em mulheres jovens (assim como o nosso caso). Esse linfoma se apresenta como uma massa localizada no mediastino anterior de crescimento rápido e provavelmente origina-se de uma população nativa de células B provenientes do Timo. Ao diagnóstico esses tumores estão normalmente limitados e sem evidêcias de doença extratorácica, porém é possível a recorrência em fígado, rins e SNC. O tratamento é oncológico incluindo PQT/radioterapia, de acordo com indicação e estadiamento.
Finalmente, este caso nos ensina a seguir sempre com o raciocínio clínico baseado na apresentação do paciente, solicitação correta e avaliação de resultados de exames complementares, para diagnósticos diferenciais dos quadros que nos são apresentados nas provas ou na vida. Saber suspeitar é mais importante do que parece e pode te levar ao diagnóstico preciso que lhe faz ganhar a questão ou o seu paciente.

Nota dos autores: “Acreditamos na medicina humanizada, compartilhamos a angústia e as dores dos pacientes, oferecemos conforto aos mesmos e seus familiares e estudamos com o objetivo de estarmos sempre aptos a diagnosticar com precisão e oferecer o melhor tratamento”


#MestredosMagos + HJ